Frase do dia

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terça-feira, 2 de novembro de 2010

Poema de Finados, Manuel Bandeira

Amanhã que é dia dos mortosrosas
Vai ao cemitério. Vai
E procura entre as sepulturas
A sepultura de meu pai.

 
Leva três rosas bem bonitas.
Ajoelha e reza uma oração.
Não pelo pai, mas pelo filho:
O filho tem mais precisão.


O que resta de mim na vida
É a amargura do que sofri.
Pois nada quero, nada espero.
E em verdade estou morto ali.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Tragédia Brasileira, Manuel Bandeira

Misael, funcionário da Fazenda, com 63 anos de idade.
Conheceu Maria Elvira na Lapa - prostituída, com sífilis, dermite nos dedos, uma aliança empenhada e os dentes em petição de miséria.
Misael tirou Maria Elvira da vida, instalou-se num sobrado no Estácio, pagou médico, dentista, manicura... Dava tudo quanto ela queria.
Quando Maria Elvira se apanhou de boca bonita, arranjou logo um namorado.
Misael não queria escândalo. Podia dar uma surra, um tiro, uma facada. Não fez nada disso: mudou de casa.
Viveram três anos assim.
Toda vez que Maria Elvira arranjava namorado, Misael mudava de casa.
Os amantes moraram no Estácio, Rocha, Catete, Rua General Pedra, Olaria, Ramos, Bonsucesso, Vila Isabel, Rua Marquês de Sapucaí, Niterói, Encantado, Rua Clapp, outra vez no Estácio, Todos os Santos, Catumbi, Lavradio, Boca do Mato, Inválidos...
Por fim na Rua da Constituição, onde Misael, privado dos sentidos e de inteligência, matou-a com seis tiros, e a polícia foi encontrá-la caída em decúbito dorsal, vestida de organdi azul.
BANDEIRA, Manuel. Antologia poética. 7. ed. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1974. pp.108-9.

sábado, 22 de agosto de 2009

Alumbramento, de Manuel Bandeira



Eu vi os céus! Eu vi os céus!

Oh, essa angélica brancura

Sem tristes pejos e sem véus!


Nem uma nuvem de amargura

Vem a alma desassossegar.

E sinto-a bela... e sinto-a pura...


Eu vi nevar! Eu vi nevar!

Oh, cristalizações da bruma

A amortalhar, a cintilar!


Eu vi o mar! Lírios de espuma

Vinham desabrochar à flor

Da água que o vento desapruma...


Eu vi a estrela do pastor.

Vi a licorne alvinitente!

Vi... vi o rastro do Senhor!...


E vi a Via-Láctea ardente...

Vi comunhões ... capelas ... véus...

Súbito ... alucidamente...


Vi carros triunfais ... troféus...

Pérolas grandes como a lua...

Eu vi os céus! Eu vi os céus!


Eu vi-a nua ... toda nua!

segunda-feira, 13 de julho de 2009

O Bicho, de Manuel Bandeira

de Manuel Bandeira

Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cao,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.

(BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida inteira. Rio de Janeiro: José Olympio, 1988)