Frase do dia

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

O rei reina e não governa, Tobias Barreto

(Apólogo)


Não sei porque a língua humana
Os brutos não falam mais,
Quando hoje têm melhor vida,
E há muita besta instruída
Nas ciências sociais...

Ultimamente entenderam
Que tinham também razão
De proclamar seus direitos
Pondo em uso os bons efeitos
Que trouxe a Revolução...

"Seja o leão, diz o asno,
Um rei constitucional:
Com assembléias mudáveis,
Com ministros responsáveis,
Não nos pode fazer mal.

Fiquem-lhe as garras ocultas,
Não ruja, não erga a voz,
Conforme a tese moderna
Qu'ele reina e não governa,
Quem governa somos nós...

Todas as bestas da terra,
Todas as bestas do mar
Tenham os seus delegados,
Sendo os ministros tirados
Do seio parlamentar..."

"Muito bem! grita o macaco,
A gente vai ser feliz!
Respeito a ciência alheia;
Publicista de mão cheia,
0 burro sabe o que diz.

Todavia, acho difícil
Que Dom Leão rugidor,
Sujeito à sede e à fome,
Queira ter somente o nome
De rei ou de imperador!...

Acostumado a pegar-nos
Com suas patas reais,
Calar-se, fingir-se fraco!...
Segundo penso eu... macaco...
Dom Leão não pode mais!"

Acode o asno: "Eu lhe explico,
Nada vai a objeção:
Se o rei viola o preceito,
Salvo nos fica o direito
De fazer revolução".

"Mestre burro, isto é asneira,
Palavrão de zurrador,
Esse direito é fumaça,
De que nos serve a ameaça,
Quando nos falta o valor?

Só vejo, que bem nos quadre
No trono, algum animal,
Que coma e viva deitado:
o porco!... Exemplo acabado
De rei constitucional..."

(1870)

Tobias Barreto de Meneses, figura de indiscutível relevo na cultura brasileira, professor de Direito que, na Faculdade do Recife, abriu novos rumos ao ensino jurídico no Brasil, a par de suas obras nessa especialidade e de estudos filosóficos que tiveram grande repercussão, foi também poeta e, por vezes, feriu notas brejeiras em sua lira. Poeta, não figura entre os maiores, embora como humorista do verso lhe não faltem graça e espontaneidade. Nascido no Sergipe a 7 de junho de 1839, faleceu no Recife a 27 de junho de 1889.

O apólogo acima foi extraído do livro "Antologia de Humorismo e Sátira", Editora Civilização Brasileira - Rio de Janeiro, 1957, pág. 95.

http://www.releituras.com/tbarreto_menu.asp

Um comentário:

  1. O poema se refere ao parlamento implantado no brasil do segundo reinado,pouco depois do golpe da maioridade.
    A ideia central que as politicas que sao aplicadas so para beneficiar somente qem tem poder, e que a populaçao por sua vez descobre seus direitos de voto ,e queriam soluçoes para melhoria de suas vidas,estavam cansados de aceitar tudo calados resolveram entao interferir ao governo e ter voz ativa para compra o que se foi prometido.

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